Em tempos de Brasil dividido, impasse não visto desde a redemocratização do país em 1989, o Camelo Urbano traz o exemplo de um político que colocou em evidência a mobilidade urbana e provou como o domínio pelo espaço público representa uma queda-de-braço eivada de sentidos plenamente políticos. Estamos falando de Enrique Peñalosa, prefeito de Bogotá, Colômbia, de 1998 a 2001, conhecido por usar medidas engenhosas e, para muitos, duvidosas para dissolver problemas crônicos em sua cidade. Dentre as principais mudanças, destacam-se três, não apenas pela sua eficácia, mas também pelas ideologias por trás delas.
As famigeradas BRTs, tão em voga agora no Rio, já faziam parte das políticas de Peñalosa lá no final dos anos 90, que por sua vez tinham sua inspiração nos modelos de ônibus de Curitiba. Segundo Peñalosa, faixas expressas exclusivas para ônibus representam um ganho gigante para a população. De acordo com ele, as pessoas tendem a considerar o metrô e o trem transportes do futuro e associam o ônibus ao atraso, vendo-o como transporte de pobre. Na verdade, a indústria ferroviária movimenta milhões anualmente e esse tipo de visão atende perfeitamente aos interesses desses empresários. De nada adianta estendermos a malha subterrânea a limites exponenciais, se o trânsito sobre a terra não para de crescer nunca. Sem contar que o ônibus rápido é uma bela alternativa ao carro. Afinal de contas, num sistema democrático, têm mais direitos 100 pessoas dentro de um ônibus do que 1 indivíduo dentro de um carro.
Como salienta Peñalosa, o carro é um símbolo de ascensão social em diversos países do globo. Contra isso, não há o que se dizer, mas a questão é que os carros roubam espaço público das pessoas. Ou seja, carros são um golpe ao pensamento na coletividade. Nenhuma constituição do mundo prevê estacionamento obrigatório. A escolha pela cessão de espaços para estacionamentos é meramente uma questão de atitude. Precisamos lembrar que a cidade é feita para as pessoas e não para os seus carros. Quanto mais se restringe o uso do carro, mais ele perde poder. E para isso há diversas maneiras: sistema de rodízio, pedágio e, principalmente, o bloqueio das ruas para carros. Diversos foram os urbanistas europeus que transformaram ruas em calçadões. Embora tenham ganhado muita cara feia no início, principalmente por parte dos comerciantes, o resultado no final era sempre bom: com menos rua, há sempre menos congestionamento.
Haddad, atual prefeito de São Paulo, quer entregar 400km de malha cicloviária até o fim do seu mandato. Faltam 279km. Peñalosa conseguiu forjar 359km em Bogotá. Mais uma vez, tudo se resume a uma questão de atitude. A construção de ciclovias é um poderoso símbolo da democracia, porque com ela, você diz que um cidadão com uma bicicleta de 30 dólares é tão importante quanto um cidadão com um carro de 30 mil. Além de tornar a cidade mais bonita, saudável e sustentável, o uso de bikes torna a cidade mais igualitária. Um rico e um pobre, mesmo que a diferença de preço das bikes seja gritante, quando se encontram na ciclovia, sentem-se iguais.
Países como Holanda e Dinamarca, mesmo com condições climáticas adversas, conquistaram a transição carro -> bike por um motivo simples: são sociedades igualitárias por definição. Elas acreditam na distribuição da renda. O desenho urbanístico de uma cidade sempre reflete os seus valores mais íntimos. Eles dão uma aula sobre a necessidade de destinar espaço nas ruas para a construção das ciclovias e melhor forma de posicioná-la!
O caminho mais idôneo da política sempre será no sentido de promover a igualdade, dissolver esquemas viciosos que só favorecem a pequenos grupos. Ou seja, tirar o excesso de peso de um lado para promover o equilíbrio da balança. Só assim uma sociedade pode ser feliz. Isso significa redistribuir a renda, chacinar oligarquias, trucidar coronelismos e totalitarismos. Só assim vamos diminuir as distâncias entre Norte & Sul, petrarcas e coxinhas, vermelho e azul.
Querendo ou não, quando voltamos de bike do trabalho, podemos economizar o dinheiro da passagem de ônibus ou as despesas de um carro. No final do ano, sempre vai representar uma bela economia. O ciclista urbano representa o sujeito que não quer isolar-se num automóvel fechado e estressado no trânsito. Através desta prática fica mais fácil explorar diferentes bairros da cidade e encontrar atrações que poderiam facilmente ser deixadas de lado em um automóvel, por falta de onde parar. De posse de seu transporte solitário e barato, ele desafia a lógica instaurada que sempre privilegia o material em detrimento do humano.
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